É técnico oficial de contas. Como veio trabalhar para o setor segurador?
O meu pai foi nomeado Agente-geral do Sun Insurance Group a 1 de janeiro de 1962 e, quando completei o ensino secundário, em junho de 1974, entrei na empresa do meu pai. Depois disso, o meu pai conseguiu que eu entrasse na Sun Alliance no Reino Unido. Comecei em fevereiro de 1975 e trabalhei durante um ano no escritório de Chancery Lane da Sun Alliance. Vir de um pequeno escritório em Malta, onde era habitual o contacto com os clientes, para um escritório no R.U., em que todo o negócio vinha através de corretores ou agentes, sem ter contacto algum com os clientes, pareceu-me estranho na altura. A filial da Sun Alliance onde trabalhava ficava mesmo ao lado da Law Society of England and Wales [correspondente à Ordem dos Advogados em Portugal - N. do T.] e nas imediações da Lincoln’s Inn, que é como uma segunda casa dos profissionais do Direito em Londres. Devido a este facto, uma parte significativa dos negócios desta filial chegava-nos por intermédio de advogados, fosse por apresentações pessoais ou no papel de agentes.
Na época, a Sun Alliance estava num estágio inicial em termos de informática. A maior parte do trabalho que me davam consistia em transferir dados de propostas em papel para registos de computador através de cartões perfurados, o que eu achava monótono e pouco interessante. Nessa época em que vivia em Londres, conhecia vários amigos malteses com quem tinha andado na escola e que estudavam contabilidade. Pensava que, com a minha queda para os números, a contabilidade tinha mais a ver comigo. Para grande desagrado do meu pai decidi mudar de profissão e iniciar uma carreira em contabilidade. Passei os cinco anos seguintes a trabalhar como escriturário, frequentando durante um desses anos um curso básico no instituto politécnico do norte de Londres, o que acabou por ser muito divertido, por me dar a oportunidade de conhecer estudantes como eu de todas as partes do mundo.
Durante o meu primeiro ano no Reino Unido vivi com uma família em Kew Gardens, o que foi decisivo no desenvolvimento da minha carreira. O proprietário da casa onde vivia era corretor da bolsa e falava-me do que se passava diariamente na bolsa de valores de Londres. Foram tempos interessantes tanto política como financeiramente. Em 1974 a bolsa tinha sofrido um colapso e, a seguir, a Grã-Bretanha passara por um tremendo abalo industrial e caos económico, com a inflação a chegar a uns 16%. Para cúmulo, a questão irlandesa voltara a surgir e todos tomámos consciência do que realmente era o terrorismo.
Viver em Londres, apesar de todos estes problemas, foi fantástico e abriu-me os olhos. Gostei muito da experiência, porque Londres tem muito para oferecer aos mais variados níveis.
Fui qualificado como Técnico Oficial de Contas em 1981 e regressei a Malta pouco tempo depois, voltando a integrar a empresa do meu pai.
Nessa altura, a empresa do meu pai juntou a sua vertente de seguros à do agente da London Insurance. À data, o estado maltês tomou medidas no sentido de uma regulamentação mais aprofundada da indústria seguradora local. Como tinha havido a fusão da Sun Insurance e da London Insurance no Reino Unido em 1965, ambos agíamos em nome do que era fundamentalmente a mesma empresa. A Sun Alliance and London, nome da empresa naquela época, solicitou aos seus agentes respetivos que fusionassem as nossas operações locais. Assim, criámos uma empresa, a Elmo Insurance Agency Ltd em janeiro de 1981. Foi uma fusão de grande sucesso que nos permitiu avançar em frente.
Inicialmente a minha função estava limitada à área financeira. Contudo, pouco a pouco, fui-me envolvendo na vertente do negócio de seguros. Em 1986, a Elmo começou a informatizar os processos da empresa e, em colaboração com o diretor-geral, dediquei-me ao processo de informatizar os arquivos e processos da empresa.
Tem uma longa carreira nos seguros. Pode destacar alguns dos momentos mais relevantes?
Sem sombra de dúvida, o momento mais memorável e também mais inquietante na minha carreira prende-se com a transformação da Elmo, de agência para uma seguradora, que assume riscos.
A 19 de setembro de 2002 recebi uma carta do CEO da Sun Alliance a comunicar que a Sun Alliance já não tinha capacidade para prestar serviço a agências diretamente a partir de Londres, faltando-lhe a infraestrutura necessária. Sabendo nós que a Sun Alliance passava por dificuldades financeiras relacionadas com a exposição ao mercado americano da asbestose, não fazíamos ideia da gravidade da questão. Recebemos essa notícia que era difícil de entender, porque sempre tínhamos apresentado resultados positivos. Informaram-nos de que éramos uma das duas últimas agências que ainda operavam diretamente através de Londres. A notícia atingiu-nos como um relâmpago, forçando-nos a ponderar a melhor forma de prosseguir. Procuraríamos outro parceiro, continuando a atuar como agente, ou converter-nos-íamos em seguradora? O problema colocava-se nos seguintes termos:
- Conseguiríamos o apoio dos resseguradores, uma vez que, segundo nos diziam, a nossa carteira de clientes e mercado eram muito pequenos para os interessar?
- Conseguiríamos capital suficiente para satisfazer os requisitos legais e regulamentares?
Felizmente, desde janeiro de 2000, a Sun Alliance tinha estabelecido exigências relativamente ao resseguro da nossa carteira. Na altura, tivemos dificuldade em compreender como é que uma empresa tão capitalizada como a Sun Alliance tinha optado por essa via. Éramos ambos lucrativos e os capitais seguros não eram muito significativos. Sem nos darmos conta, este facto foi-nos de grande utilidade porque herdámos os tratados e acordos de resseguro da Sun Alliance quando nos convertemos numa empresa seguradora. Conseguimos fazê-lo porque tínhamos construído uma reputação junto das empresas de resseguro, que tinham tido a oportunidade de conhecer bem a nossa empresa. Quando decidimos avançar na transformação do nosso negócio numa empresa que assumiria risco, já estávamos habituados a lidar com questões de resseguro, o que nos ajudou a cumprir o nosso objetivo de nos tornarmos uma seguradora.
Um fator importante que nos ajudou a chegar a tal decisão prende-se com a excelente relação que tínhamos com um quadro sénior do Sun Alliance Group, Roger Bellamy, então prestes a reformar-se antecipadamente. A sua ajuda foi crucial para nos libertar de compromissos contratuais de longa data com o grupo Sun Alliance e nos ajudar a percorrer o caminho que tínhamos escolhido. O processo correu tão bem que, quando conseguimos autorização para atuar como seguradora, convidámos o Roger para o nosso conselho de administração. Ele aceitou e, apesar de viver no Reino Unido, deslocou-se a Malta todos os meses durante 15 anos para passar uma semana connosco. O seu contributo para o desenvolvimento da empresa tem sido incalculável.
Tornámo-nos uma seguradora a 1 de maio de 2004, no mesmo dia em que Malta se tornou membro da UE e, desde então, temos sempre olhado para o futuro. Sabendo o que sabemos agora, foi o melhor que nos podia ter acontecido.
Outro desenvolvimento importante foi a formação de uma joint-venture com a corretora JLT Insurance. Pouco tempo depois de Malta se tornar membro da UE, tornou-se evidente que Malta estava bem posicionada para desenvolver a sua indústria de serviços financeiros. Eu tinha lido um artigo no Financial Times relacionado com uma entrevista com o Nick Wild, que liderava o negócio de cativas da JLT Insurance Management. O Roger Bellamy conhecia vários quadros sénior na JLT e contactou a empresa. Encontrei-me com o presidente-adjunto da JLT em 2007 e acordámos em constituir uma empresa local de gestão de seguros. A JLT detinha capital na SIACI ST. Honoré, uma grande corretora de seguros de Paris que, por sua vez, detinha uma empresa muito dinâmica de gestão de cativas de seguros com sede no Luxemburgo e os trouxe para a nossa empresa local em 2009. Cada parte detinha 33% do capital acionista. Quando a JLT foi absorvida pela Marsh há alguns anos, a 2RS e a Elmo Insurance Ltd. chegaram a um acordo amigável através do qual adquiriram o interesse detido pela JLT.
A 2RS-Elmo, desde então, tem vindo a construir uma interessante carteira de clientes, gerindo duas PCC, cinco células e duas seguradoras. Pessoalmente este desenvolvimento traz-me muita satisfação, porque não só conseguimos criar a nossa própria seguradora mas também apoiamos várias empresas europeias de grande relevância na criação das suas seguradoras. Gosto de formar parcerias com empresas e pessoas de toda a Europa que participam em vários negócios interessantes. Acontece até que a 2RS Luxembourg foi eleita recentemente principal gestora de seguros pela associação de gestores de seguros em 2024.
É diretor-geral da Elmo Insurance, uma das maiores seguradoras maltesas. Pode falar-nos da origem da Elmo Insurance e como se tem desenvolvido até hoje?
Somos a quarta maior seguradora local em Prémios Brutos Emitidos. Das origens da empresa já falei acima. A Elmo é detida por duas empresas, a Cassar & Cooper Holdings Ltd. e a C&H Bartoli Ltd., agentes originais das seguradoras London e Sun Insurance.
A economia maltesa tem prosperado ao longo dos últimos 35 anos, mais desde que Malta se tornou membro da UE em 2004. Quando a Elmo foi criada em janeiro de 1981 não tinha mais de 14 trabalhadores. Hoje, dá trabalho a cerca de 130 pessoas. 117 pessoas da equipa trabalham na Elmo Insurance Ltd. que é, de longe, o núcleo principal das operações da Elmo nos seguros. Também detemos uma pequena corretora de seguros que tem 4 colaboradores, e que usamos para colocar riscos de tipo financeiro, como a Responsabilidade Civil Profissional e D&O. A Elmo detém 49,5% da 2RS-Elmo, a gestora de seguros que operamos em conjunto com a 2RS Luxembourg. Esta empresa tem dez colaboradores, sete dos quais contabilistas.
O valor dos Prémios Brutos Emitidos da Elmo Insurance ronda os €35 milhões, 55% dos quais representados por seguro automóvel. A empresa é apoiada por vários resseguradores líderes na Europa. Oitenta por cento das nossas necessidades de resseguro são colocadas em resseguradores de notação AA, a maior parte dos quais faz parte do nosso painel de resseguradores desde 2012 e mesmo alguns desde 2005.
Malta é um mercado sofisticado, financeiro e de seguros, com um regulador forte e exigente, embora por vezes essa não constitua a impressão geral. Como descreve este mercado, e que lhe parece que Malta pode fazer para mudar esta ideia ou perspetiva?
Como ilha minúscula mesmo ao centro do Mediterrâneo, sem outros recursos naturais que não o sol, o mar e o calcário, Malta viu-se obrigada a desenvolver a sua economia a partir do nada desde que se tornou independente em 1964. Malta tem uma história riquíssima. As potências militares do Mediterrâneo sempre quiseram conquistar a ilha em virtude da sua posição neste mar e dos seus portos seguros. A nossa economia vive do turismo, graças ao nosso clima e à nossa história, da manutenção de aeronaves, e da indústria ligeira de manufatura.
Outra indústria cada vez mais importante são os serviços financeiros. Têm tido um grande desenvolvimento ao longo dos últimos 20 anos. O que nos ajudou foi que, sendo uma antiga colónia do Reino Unido, em Malta o inglês é a segunda língua e, tradicionalmente, o direito comercial de Malta baseia-se no 1948 Companies Act da Grã-Bretanha, o que ajudou a facilitar o desenvolvimento deste setor.
Malta é conhecida como domicílio de cativas, sendo o único membro da UE com legislação respeitante às empresas de célula protegida (Protected Cell Companies, PCC). Em sua opinião, quais são as vantagens de criar uma célula numa PCC em vez de uma cativa individual?
As principais vantagens de criar uma célula numa PCC face a uma empresa individual são os requisitos mais baixos de capitalização, menos custos administrativos e um processo de aprovação mais rápido por parte do regulador. Além disso, o investimento de tempo por parte do proprietário da célula é inferior, uma vez que não tem de participar em reuniões do conselho de administração. Em comparação com as jurisdições offshore, como Guernsey e Bermuda, a legislação de Malta sobre as PCC exige que as células individuais tenham um mecanismo de recurso sobre os fundos próprios de base da PCC. Isto assegura que os tomadores de seguro terceiros ou beneficiários de uma célula tenham o mesmo nível de proteção a que são obrigadas as outras seguradoras da UE.
Como vê o mercado de seguro a evoluir nos próximos anos? Tanto em Malta como no mundo.
Malta é um país muito pequeno, com uma população de aproximadamente 542 000 pessoas, 28% das quais são estrangeiras. Há dois grandes bancos em Malta. O HSBC (Malta) Ltd. e o Bank of Valletta. Cada um tem cerca de 40 filiais e, juntamente, controlam cerca de 80% do mercado bancário de Malta. Por causa da falta de concorrência no setor bancário e da sua posição dominante, o regulador local dos seguros limitou a participação dos bancos nos seguros Não-Vida, sabendo o que ocorreu no mercado de seguro de Vida, onde dominam completamente a atividade. Estes bancos pressionaram as nossas autoridades financeiras para lhes permitir a entrada no mercado de seguros Não-Vida, o que seria muito preocupante para as seguradoras locais.
Globalmente, é evidente que a indústria atravessa um processo de digitalização que revoluciona a gestão de sinistros, permitindo às seguradoras tornar mais eficiente o processo de regularização. Integrar as capacidades analíticas de dados com ferramentas digitais ajuda as seguradoras a avaliar os processos de sinistro e a monitorizar a sua carteira de clientes para efeitos de marketing.
A inteligência artificial vai acentuar o processo, o que afetará substancialmente o marketing, as vendas, as operações relativas aos clientes, o desenvolvimento de software e, por último, os níveis de emprego.
Que conselho daria aos novos profissionais que entram na indústria?
Para gerir uma seguradora de sucesso há que contar com pessoal com aptidões variadas, ou seja, subscritores, vendedores, programadores, especialistas em compliance, gestores de risco, contabilistas, juristas, especialistas em recursos humanos, atuários, especialistas em marketing, etc. Há que escolher a área onde encaixamos melhor e iniciar um processo que assegure a aquisição das habilitações literárias adequadas para garantir a devida compreensão da especialização que escolhemos. Também recomendo que se procure trabalhar numa empresa de boa reputação e conhecida pela qualidade da formação que dá aos seus trabalhadores.
A 2RS Elmo, a vossa empresa de gestão de cativas, gere a HighDome, PCC do Grupo MDS, desde o seu início. Pode falar-nos da sólida relação que desenvolveu com o Grupo MDS ao longo dos anos?
A 2RS Luxembourg, originalmente, geria uma cativa de resseguro propriedade da então empresa-mãe da MDS, o Grupo Sonae. Discutiu-se com a 2RS-Elmo (filial da 2RS Luxembourg) a possibilidade de tirar partido da legislação financeira maltesa para formar uma PCC (figura única em toda a UE). A liderança da MDS acreditava que a formação de uma PCC traria oportunidades dentro da rede Brokerslink, que tem uma forte ligação à MDS.
A MDS fundou a HighDome PCC em 2011 e desde então tem conseguido atrair várias células, tanto do Grupo Sonae como de outros clientes. A relação entre a MDS e a 2RS-Elmo tem sido excelente, quer a nível profissional quer pessoal, tendo esta gerido a HighDome desde sua a criação.
Sente a paixão da vela. Começou muito cedo, ou foi algo que surgiu depois? Quer partilhar alguma aventura de navegação?
A vela tem-me dado imenso prazer, é uma fonte de relaxamento. Passo praticamente todo o dia sentado à secretária ou em reuniões, por isso é um alívio poder escapar a tudo e simplesmente enfrentar os elementos.
Não tinha mais de 8 anos quando o meu pai me ensinou a pilotar num bote Swordfish. Mais tarde comprou um Gull, que era um barco de madeira, muito pesado, ideal para aprender a velejar. Em 1981, com 25 anos, apaixonei-me pelo windsurf, que me entusiasmava muitíssimo. Só perto dos cinquenta anos consegui comprar um veleiro de 14m.
Posso contar muitas experiências dos meus primeiros anos (o meu pai tinha um barco a motor com cabine quando eu era mais jovem). Contudo, a que mais se destaca e nunca esquecerei foi quando trouxe para Malta o barco que adquiri em dezembro de 2006 em Port Grimaud, no sul de França. A caminho de Malta, saímos de Porto di Roma às três da tarde um dia e, dentro de 30 minutos, o GPS avisou-nos de que íamos entrar numa área de exercícios navais da força aérea italiana. Ordenaram-nos explicitamente que corrigíssemos a rota para ocidente, seguindo o ponto 270 da bússola durante umas quarenta milhas. Isso atrasou-nos o regresso a Malta umas cinco ou seis horas, pelo menos. No dia seguinte, o mar estava em plena calmaria e, viajando toda a noite, chegámos a Capri pelas três da tarde, reabastecemo-nos e continuámos para sul com um tempo excecionalmente favorável.
Planeávamos cruzar de Capri diretamente para o Estreito de Messina, perdendo terra de vista no caminho. Contudo, pelas onze da noite, o tempo alterou-se drasticamente e, no rádio do GPS, ouvimos vários avisos sobre uma tempestade que se avizinhava. Caiu sobre nós à meia-noite. Nessa altura não avistávamos a costa, algures entre Nápoles e Salerno. Os céus abriram-se, fomos bombardeados pela chuva e o mar encapelou-se. Estávamos envoltos por uma tempestade de categoria 8 num barco recém-adquirido com o qual tínhamos pouca experiência. Felizmente, para além de ter um amigo de infância a bordo, tinha contratado dois marinheiros muito experientes para ajudar e eles assumiram o controlo do barco. Um deles tomou o leme e conduziu-nos através dos mares em fúria, encharcado até aos ossos. Tal era a turbulência que, num minuto ou dois, três ondas gigantescas se abateram sobre o a cabine e a água entrou por uma escotilha semiaberta que dava para o salão, inundando-o. Enfrentávamos ventos de 48 a 40 nós. Mas o mais assustador é que estávamos numa rota que levava petroleiros a um grande terminal e, na noite escura e nos uivos da tempestade passámos por um petroleiro após outro, que pareciam saídos do nada, apesar de termos radar a bordo. O que nos assustou acima de tudo era a possibilidade de não conseguir evitar um destes gigantes que viajavam a 12-15 nós.
Decidimos aproximar-nos de terra para nos protegermos parcialmente de uma tempestade de sudeste que nos batia pela proa. Cerca das cinco da manhã avistámos terra e, como que por milagre, de madrugada o vento desceu para vinte e cinco nós, o que aliviou toda a gente. Decidimos continuar atravessando o Estreito de Messina e parando no porto de Riposto na Sicília nessa noite, antes de nos dirigirmos para Malta no dia seguinte. Nessa altura, nunca tinha vivido nada semelhante. Até hoje dou graças por voltarmos a casa sãos e salvos. O barco saiu-se muito bem.
Outra paixão sua é a história, o que não surpreende, pois Malta tem um passado rico e turbulento. Pode contar-nos os episódios mais relevantes da história de Malta?
A história de Malta é fascinante. Podia falar dela durante horas. Em suma, a posição de Malta mesmo no centro do Mediterrâneo, equidistante de Gibraltar e Alexandria e a uns meros 80km da Sicília, bem como a 338km da Tunísia, atraiu várias potências da região, já que Malta possui vários portos abrigados e todas as embarcações que atravessam o Mediterrâneo podem facilmente chegar a Malta. Malta pode orgulhar-se de três locais elevados a Património da Humanidade que incluem a capital, Valletta, o Hipogeu de Hal Saflieni e ainda sete templos megalíticos que datam de 5500 a.C. São mais antigos do que as pirâmides do Egipto. Dizem até que são “os monumentos mais antigos do mundo”.
Malta foi ocupada por fenícios, cartagineses, romanos, árabes, normandos, aragoneses, pela Ordem dos Cavaleiros de S. João, pelas tropas de Napoleão e ainda pelo Reino Unido, tornando-se independente deste em 1964. Cada um deles deixou a sua impressão neste pequeno arquipélago. Malta tem a sua própria língua, de raiz semítica. A língua maltesa tem a sua origem ou nos fenícios ou nos árabes. Sendo próxima do árabe, escreve-se no alfabeto romano. Os Cavaleiros de S. João, os cruzados originais, que respondiam apenas perante o Papa, certamente deixaram uma pegada importante na ilha. Construíram vários edifícios impressionantes. Valletta é um tesouro barroco com fortificações imponentes. Os Cavaleiros de S. João foram expulsos de Rodes em 1522. O Papa pediu ao Sacro Imperador Romano, Carlos V de Espanha, que concedesse Malta aos Cavaleiros de S. João, pedido a que ele acedeu. O imperador “alugou” Malta aos Hospitaleiros por uma renda anual de um falcão maltês.
Assim que os Cavaleiros se instalaram em Malta começaram a fortificar a ilha, sabendo que os otomanos atacariam a ilha. Assim foi. Em 1565, mandaram uma armada contra Malta transportando 35 000 combatentes. Teve lugar uma batalha épica. Após um cerco de quatro meses, os otomanos partiram, tendo perdido 25 000 homens. Isto firmou o lugar de Malta como parte do mundo cristão. Napoleão, a caminho do Egipto, invadiu Malta em junho de 1978 após os cavaleiros franceses concordarem com as suas exigências. Nos seis dias subsequentes à rendição e partida de Napoleão para o Egipto, redigiu-se um código civil para Malta que forma a base do nosso direito civil atual.
Os malteses não estavam muito agradados com os franceses e revoltaram-se pouco tempo depois. Tanto que pediram à Grã-Bretanha que os ajudasse a expulsar os franceses em 1800. Os britânicos permaneceram em Malta até à independência da ilha em 1964.
Malta passou por um segundo cerco durante a II Guerra Mundial. Estando praticamente todo o Mediterrâneo nas mãos do Eixo, Malta foi usada pelo Reino Unido como um vetor de ataque. Mantendo aí uma base de submarinos e outra para aeronaves, Malta complicou seriamente os planos do Eixo para o norte de África. Contudo, pagou um preço elevado e foi bombardeada incessantemente entre 1940 e princípios de 1943. Foi graças à determinação de Churchill em reter Malta, enviando quantidades incessantes de alimentos, combustível e munições, que a ilha não caiu perante as potências do Eixo.
A influência britânica em Malta está por toda a parte. A maior parte dos malteses fala inglês fluentemente e este é reconhecido como segunda língua oficial. O direito comercial de Malta tem a sua base no 1948 Companies Act do Reino Unido. Estes fatores, incluindo a entrada de Malta na UE em 2004, ajudaram a gerar um ambiente que potencia um centro financeiro próspero.
Circunstâncias como estas ajudaram-nos a atrair a MDS a Malta e permitiram-nos desenvolver uma relação profissional mutuamente benéfica.